
A protagonista se chama Maria Helena, mas, volta e meia, na hora de contar uma história, confunde-se e troca o próprio nome por Maria Emília, Regina Célia, Maria Célia... Transparece não saber se o episódio foi protagonizado por ela mesma ou por alguma das amigas. É o que praticamente aconteceu com a autora, a atriz Patricya Travassos, na hora de escrever Monstra, que estréia quinta-feira, no Teatro dos Quatro, na Gávea, depois de curta temporada na Caixa Cultural. Com direção de Jorge Fernando, a peça é uma adaptação do livro homônimo lançado no fim de 2006, que, por sua vez, é a coletânea de três anos de crônicas escritas para a revista feminina Marie Claire.
– A gente arquiva informações o tempo todo sem perceber. Quando vai escrever, aquilo vem à tona – diz a atriz. – As crônicas para a Marie Claire reúnem coisas que aconteceram comigo, com amigos, com desconhecidos. Invento muita coisa também e pego inspiração, às vezes, de reportagens e depoimentos da própria revista.
Parceiros em quatro novelas, especiais de TV, alguns filmes, desfiles de moda e uma vez no teatro, na peça No escurinho do cinema (1997), Patricya e Jorge Fernando, reunidos para uma conversa pelo Jornal do Brasil, afirmam que o encontro dos dois é como andar de bicicleta.
– A gente trata o humor de maneiras diferentes, mas temos uma afinidade incrível. A gente pode passar um tempão sem trabalhar junto, mas quando retoma é tudo muito fácil – elogia o diretor. – Não enrolamos. A peça foi montada em, no máximo, seis meses.
Jorge Fernando tem um humor mais escrachado, mais direto, como demonstra no monólogo Boom, que, ano que vem, faz 10 anos em cartaz. Patrycia gosta de um trabalho menos caricato. Aposta na comédia de situações. Em Monstra, a sutileza ganhou.
– Está mais para Woody Allen do que para Mel Brooks – define Jorge Fernando. – Antigamente, o riso vinha da forma: era engraçado um cara simplesmente bater com a cara na parede. Agora, você precisa conhecer o estado emocional do personagem para que, quando ele bater com a cara na parede, aquilo seja parte de um contexto.
A atriz completa:
– É como uma tragicomédia. Você ri, mas o personagem está chorando. Tem um lado patético do ser humano evidente.
Armadilhas emocionais
No livro, são mais de 30 crônicas sobre facetas da mulher contemporânea. Para o palco, foram escolhidas oito delas, que se ligam numa história linear. A trama se passa durante uma conferência de auto-ajuda, em que a palestrante, a terapeuta vivida por Patricya Travassos, é a prova viva de que seus ensinamentos não se aplicam a ela.
Dividindo a cena com Ricardo Duque e Daianny Cristian, a atriz relata casos que supostamente deveriam ser curados com o método da personagem. Mas acaba caindo em todas as armadilhas emocionais que pretende curar.
– Um dos casos relatados acontece com uma amiga minha: ela diz que tem um distúrbio hormonal que a deixa no cio; compara-se a uma loba no alto da montanha uivando para atrair o macho. Pensa em sexo durante 24 horas, fantasiando com garçons e o próprio chefe nu – diverte-se Patricya. – Em outra das histórias, a libido de uma mulher muda depois que ela vai à depiladora. Ela tem um desejo incubado que nem a terapia havia resolvido.
Cria do lendário grupo Asdrúbal Trouxe o Trombone, no qual iniciou a carreira ao lado de nomes como Regina Casé, Luiz Fernando Guimarães e Evandro Mesquita, a atriz diz que Monstra remete ao processo criativo daquela época de iniciante.
– O que estou fazendo aqui é o meu sonho de consumo – define a autora, que ganhou dois meses de folgas da novela Caminhos do coração, da Record, para se dedicar ao espetáculo. – É um projeto autoral, como os do Asdrúbal.
A atriz, que também apresenta o programa Alternativa saúde, exibido às quartas-feiras no GNT, se espantou com o reconhecimento do seu lado cronista – não só pelas mulheres, público alvo da revista, mas também por homens:
– Acho que não sou capaz de escrever uma ficção, mas me surpreendi com o alcance das minhas crônicas. De um rapaz me parar no Aeroporto do Recife enquanto eu comia um pão-de-queijo para falar que uma crônica relatava um fato que tinha acontecido igualzinho com ele. Outro perguntava como eu tinha descoberto a história dele. E ainda era uma coisa meio picante, de um triângulo amoroso. A conclusão é que as pessoas estão mesmo muito solitárias.




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